Entrevista com o Professor Albino Duvane: A Cooperação entre a AICS e a REMOTELINE para a Inclusão de Pessoas com Deficiência Auditiva em Moçambique.

Hoje celebramos o Dia Internacional da Língua de Sinais, a data visa destacar a importância das Língua de sinais na garantia dos direitos humanos de pessoas com limitações auditivas.

 Em Moçambique, de acordo com os últimos dados oficiais do Instituto Nacional de Estatística (INE) em 2017, existem 68.000 pessoas com deficiência auditiva e mutismo. As pessoas com deficiência auditiva enfrentam vários desafios, incluindo a falta de uma língua gestual universalmente reconhecida. Em todo o mundo, existem mais de 300 variedades de línguas gestuais, o que torna a comunicação mais complexa para as pessoas que crescem em diferentes regiões. Esta diversidade linguística acrescenta mais barreiras à comunicação, a par de limitações na educação inclusiva e do risco de discriminação.

Para assegurar o acesso à informação para pessoas com deficiência auditiva, a AICS tem colaborado com a empresa moçambicana REMOTELINE. Por exemplo, durante a Conferência Nacional de Educação de Qualidade em julho, seis intérpretes da REMOTELINE proporcionaram tradução em Língua de Sinais em todas as sessões. Na FACIM, a AICS contou com dois intérpretes da REMOTELINE para traduzir palestras e o discurso do Embaixador de Itália em Moçambique, Gianni Bardini, no Dia da Itália.

Para comemorar o Dia Internacional da Língua de Sinais, realizamos uma entrevista com o Professor Albino Duvane, fundador da REMOTELINE. Durante esta conversa, exploramos os desafios enfrentados pelas pessoas com deficiência auditiva em Moçambique, discutimos potenciais soluções e examinamos o papel crucial que a cooperação desempenha na promoção da inclusão dessas pessoas. Para obter mais informações, continue lendo.

AICS Sede de Maputo: Antes de mais, queria agradecer-lhe a sua disponibilidade. Como surgiu a necessidade de estudar as línguas de sinais?

Professor Albino Duvane: Uma vez, eu estava com um colega a fazer um trabalho de sensibilização sobre a malária na Província de Gaza. Numa casa encontramos uma pessoa com deficiência auditiva, como não conhecia a Língua de Sinais, não pode partilhar informação de como proteger-se desta doença. Fiquei muito frustrado por não conseguir interagir com esta pessoa e partilhar esta mensagem importante.

Isso me deixou com um sentimento de culpa e acendeu uma chama de responsabilidade social. Eu percebi que a pessoa com deficiencia auditiva não tinha culpa de não poder ouvir ou falar oralmente; a responsabilidade de ajustar a comunicação era minha. Decide aprender a Língua de Sinais.

AICS Sede de Maputo: Conte-nos então como aprendeu a língua de sinais?

Professor Albino Duvane: A minha aprendizagem teve lugar com um jovem com deficiência auditiva que esteve na minha aldeia ensinando a lingua de sinais numa convenção religiosa. Ele compartilhou alguns conhecimentos básicos comigo, mas só pôde ficar por três dias. Após isso, fiz pesquisas online para aprender mais sobre a língua de sinais americana, embora tenha tido que adaptá-la às necessidades da nossa comunidade, pois os sinais locais eram diferentes. Naquela época, não havia uma escola de língua de sinais em Maputo, foi um processo autodidata, com orientação de algumas pessoas.

AICS Sede de Maputo: Quando comecou a trabalhar para a inclusão das pessoas com deficiência auditiva?

Professor Albino Duvane: Quando vim para Maputo, comecei a auxiliar no Hospital Central de Maputo, onde uma amiga médica trabalhava. Eu ajudava na interpretação quando havia doentes com deficiencia auditiva.

Colaborei com a Associação dos Surdos e trabalhei em parceria com o FAMOD (Fórum das Associações Moçambicanas de Pessoas com Deficiência). Isso me permitiu entender melhor como as pessoas com deficiência lidam com suas dificuldades diárias, especialmente em relação à comunicação. Essa experiência criou em mim um forte senso de responsabilidade e um desejo de criar algo que pudesse ajudá-las.

AICS Sede de Maputo : Como surgiu então a ideia de fundar a REMOTELINE?

Professor Albino Duvane : Com a chegada do COVID-19 em 2020, já não podia mais ajudar presencialmente os doentes no Hospital Central de Maputo. Foi quando surgiu a ideia de prestar serviços remotamente, e assim nasceu a “RemoteLine”. A plataforma foi criada para continuar apoiando pessoas com deficiência auditiva, mesmo no contexto da COVID e de forma remota.

AICS Sede de Maputo: Durante quase três anos de existência, quais foram os sucessos da empresa?

Professor Albino Duvane: Fizemos um trabalho de advocacia e sensibilização com a Assembleia da República, solicitando que todas as sessões plenárias que passassem na Televisão tivessem interpretação em lingua de sinais. Desde 2021 que isso acontece, oque foi um grande êxito. Colaboramos também com a Embaixada dos Estados-Unidos da América, ensinando a todo o staff a linguagem de sinais, incluindo o Embaixador. Por último referir que a FAMOD, além de ser o nosso parceiro, é também cliente.

AICS Sede de Maputo: Oque significa para a REMOTELINE e para si colaborar com a Cooperação Italiana? Como avalia a colaboração com a AICS no âmbito da FACIM e da Conferência Nacional de Educação de Qualidade ? 

Professor Albino Duvane: É uma grande honra trabalhar com a Cooperação Italiana. A Itália é um grande exemplo  na inclusão de pessoas com deficiência. Trabalhar com vocês proporciona oportunidades de melhoria das nossas intervenções em prol das pessoas com deficiência auditiva.  É também uma oportunidade para dar continuidade aos nossos projectos.

No que diz respeito à segunda pergunta, trabalhar em ambos os eventos foi de extrema importância. Os nossos intérpretes conseguiram realizar traduções simultâneas em Língua de Sinais para todas as conferências e mesas redondas da Conferência Nacional de Educação, cumprindo assim o lema do evento “Por uma Educação de Qualidade, Inclusiva e Equitativa em Prol do Desenvolvimento Sustentável’.

Além disso, foi uma grande honra participar na FACIM. Uma das nossas intérpretes sentiu-se profundamente honrada por realizar a tradução simultânea da intervenção do Embaixador da Itália em Moçambique, Gianni Bardini, no dia de Itália. Participar da FACIM também nos proporcionou a oportunidade de interagir com diversas entidades e apresentar a REMOTELINE, com o objetivo de promover a inclusão das pessoas com deficiência auditiva em Moçambique

AICS Sede de Maputo : Quais são as principais barreiras que as pessoas com deficiência auditiva enfrentam em Moçambique ?

Professor Albino Duvane: A questão da educação tem sido uma grande barreira para as pessoas com deficiência auditiva, principalmente no uso das línguas de sinais

O maior desafio enfrentado pelos surdos é quando não há língua de sinais disponíveis. Se eles forem a um hospital sem um intérprete, o diagnóstico e tratamento adequados se tornam problemáticos. Tudo se resume à questão da comunicação. A chave para superar essas dificuldades é garantir o acesso à língua de sinais em todos os serviços prestados.

AICS Sede de Maputo: Qual é a importância de ter datas, como o Dia Internacional da Língua de Sinais ?

Professor Albino Duvane: Estas datas são essenciais para refletir sobre a necessidade de apoio às pessoas com deficiência auditiva, lembrando que, apesar dos avanços sociais, ainda existem pessoas que precisam de atenção devido à negligência das suas necessidades de comunicação. Resumindo, estas datas são oportunidades para sensibilizar e lembrar a todos sobre a importância de apoiar as pessoas com deficiência auditiva.

 

 

 

 

 

 

 

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